COM CONTRATO ATÉ 2027: MINA DE TERRAS RARAS DE INVESTIDORES DOS EUA EM GOIÁS VENDE TODA SUA PRODUÇÃO PARA CHINA

COM CONTRATO ATÉ 2027: MINA DE TERRAS RARAS DE INVESTIDORES DOS EUA EM GOIÁS VENDE TODA SUA PRODUÇÃO PARA CHINA

Financiada por capital ocidental para quebrar a dependência da China, a maior mina de terras raras do Brasil se tornou, por ironia, uma fornecedora estratégica para a indústria do seu principal concorrente.

No sertão de Goiás, uma nova e estratégica mina de terras raras entrou em operação e já nasce no centro de um paradoxo geopolítico. A Serra Verde Mineração, em Minaçu, foi financiada por investidores dos Estados Unidos e do Reino Unido com um objectivo claro: criar uma nova fonte de minerais críticos fora da China. No entanto, a realidade do mercado se impôs de forma implacável.

A empresa confirmou que vendeu a maior parte da sua produção inicial para compradores chineses, em contratos que vão até, pelo menos, 2027. A história da mina Serra Verde é um caso exemplar de como a China joga o xadrez dos minerais críticos e de como boas intenções podem, na prática, acabar fortalecendo o domínio do seu maior rival estratégico.

O que é a mina Serra Verde? Um activo estratégico no coração de Goiás

A mina Pela Ema, operada pela Serra Verde em Minaçu (GO), é um activo único. Trata-se do maior depósito de terras raras de argila iônica conhecido fora da China. Essa característica geológica é a sua maior vantagem, pois permite uma mineração de baixo custo e com menor impacto ambiental, muito similar à que os chineses dominam.

O produto da mina é um concentrado rico nos quatro elementos de terras raras mais valiosos para a indústria de tecnologia: neodímio, praseodímio, térbio e disprósio. Eles são essenciais para a fabricação de ímãs de alta performance usados em motores de carros eléctricos, turbinas eólicas e sistemas de defesa.

A “Mina de Ouro” de Goiás: A História da Serra Verde, a Mina de Terras Raras do Brasil que Vende sua Produção para a China | Chinese electronics

Capital ocidental para um projecto “pró-China”

O projecto da Serra Verde foi impulsionado por um consórcio de grandes investidores ocidentais, incluindo a Denham Capital (EUA) e a Vision Blue Resources (Reino Unido). O objectivo estratégico era claro: criar um campeão ocidental na produção de terras raras para diversificar a cadeia de suprimentos e reduzir a dependência da China.

O projecto recebeu, inclusive, o endosso da Minerals Security Partnership (MSP), uma aliança de 14 países liderada pelos EUA, que visa exactamente fortalecer as cadeias de minerais críticos. A contradição não poderia ser maior: o projecto emblemático do Ocidente para se contrapor à China tornou-se, na prática, um fornecedor de matéria-prima para a indústria chinesa.

A muralha da China: por que a Serra Verde vende as suas terras raras para os chineses?

A decisão da Serra Verde de vender a sua produção para a China não foi uma escolha, mas uma necessidade. A razão é simples e brutal: a China controla cerca de 90% de toda a capacidade mundial de refino e separação de terras raras, o elo mais complexo e lucrativo da cadeia.

O CEO da Serra Verde, Thras Moraitis, foi directo ao ponto ao justificar os acordos: os chineses “eram o único cliente que poderia processar o produto e separá-lo”. O Ocidente, ao longo de décadas, terceirizou essa capacidade industrial e agora paga o preço. Mesmo com uma nova mina, não há refinarias aliadas em escala para processar o material.

A “Mina de Ouro” de Goiás: A História da Serra Verde, a Mina de Terras Raras do Brasil que Vende sua Produção para a China | Chinese electronics

Os acordos de venda: um compromisso até 2027

Embora a data exacta do anúncio do acordo seja incerta, a realidade contratual é clara. A empresa confirmou que já possui contratos de venda para a “maior parte da produção planeada” com processadores na China, e fontes do sector afirmam que esses acordos se estendem até, pelo menos, o ano de 2027.

A mina, que iniciou a produção comercial no começo de 2024, tem uma capacidade de 5.000 toneladas por ano e já estuda uma expansão que pode dobrar esse volume. Toda essa produção inicial está, portanto, contratualmente destinada a fortalecer a indústria chinesa.

Um xeque-mate chinês com terras raras

O caso da Serra Verde expõe a grande falha na estratégia ocidental. Não adianta financiar novas minas em países amigos se não existem fábricas aliadas para processar o minério. O resultado é uma dependência ainda mais complexa: o Ocidente agora depende do Brasil para a matéria-prima, e ambos dependem da China para os produtos de alto valor.

Para o Brasil, o acordo garante receita e a consolidação como um grande produtor. No entanto, o país se mantém na posição de mero exportador de commodity, capturando apenas uma fracção do valor da cadeia. Para a China, a jogada é um xeque-mate: ela não apenas garante o fornecimento de terras raras de alta qualidade, como o faz usando o capital dos seus próprios concorrentes, reforçando o seu domínio global sobre os metais do futuro.

Fonte: CPG