
Quem tem investimentos em ouro e bitcoin teve motivos para festejar nas últimas semanas. Ambos atingiram máximas históricas.
Nesta ouro ultrapassou a barreira de US$ 4.000 por onça troy (a unidade de peso para metais preciosos e que equivale a 31,1 gramas).
No domingo passado, o bitcoin atingiu um recorde ao romper a barreira de US$ 125 mil pela primeira vez, antes de recuar um pouco.
Até agora, 2025 tem sido um ano excepcional para ambas as commodities. O ouro está no caminho para ter a sua maior alta anual desde 1979. O seu preço subiu mais de 50% desde o dia 1 de Janeiro. O bitcoin teve algumas quedas ao longo do turbulento ano de 2025, mas o seu valor dobrou no período de um ano.
O QUE ESTÁ A ACONTECER?
Tradicionalmente considerado um porto seguro para os investidores em tempos de incerteza, o ouro tem apresentado uma curva ascendente acentuada desde o fim de 2018, e o seu valor aumentou mais de 300% desde então.
E a incerteza certamente tem sido um factor na actual tendência, com as tarifas de importação do presidente dos EUA, Donald Trump, em Abril, alimentando preocupações sobre a economia global, a sustentabilidade dos níveis da dívida do governo americano e até o futuro do dólar como moeda de reserva mundial.
Há ainda a incerteza geopolítica, como resultado das guerras na Ucrânia e em Gaza.
Outro factor de insegurança, mais recente, é o shutdown do governo dos EUA.
O ouro também se beneficiou da perda de confiança no iene como activo de refúgio. Apesar das acções japonesas terem subido nesta segunda-feira após a confirmação da eleição de Sanae Takaichi como líder do partido governista LDP, posicionando-a para ser a primeira mulher a liderar o país, o iene continuou a cair.
“A fraqueza do iene em decorrência das eleições do LDP deixou os investidores com um activo de refúgio a menos, e o ouro soube capitalizar”, disse o analista-chefe de mercado da KCM Trade, Tim Waterer, à agência de notícias Reuters.
Na Europa, a renúncia do primeiro-ministro Sébastien Lecornu elevou a crise política e as incertezas em relação à economia da França, a segunda maior da União Europeia, com uma dívida pública equivalente a 115% do Produto Interno Bruto (PIB), e alimentou temores de que essa situação afecte a estabilidade do euro.
A situação nos EUA eleva a atractividade do ouro. “O shutdown do governo americano significa que uma nuvem de incerteza ainda paira sobre a economia americana e sobre o potencial de qualquer impacto no PIB”, acrescentou Waterer.
No entanto, especialistas dizem que a actual alta do ouro se deve não só às dúvidas sobre o futuro da economia americana ou mesmo global. Vários analistas afirmam que houve um aumento na demanda por fundos de investimento ETF lastreados em ouro, procurados cada vez mais por investidores de todos os perfis e tamanhos.
“O facto de a demanda por ETFs ter voltado à cena com tanta força significa que existem duas formas ‘agressivas’ de procura por ouro: pelos bancos centrais e pelos investidores em ETFs”, escreveram analistas do Deutsche Bank em nota aos pclientes.
Bancos centrais de todo o mundo são tradicionais compradores de ouro, mas é a nova demanda por ETFs lastreados em ouro que impulsiona a actual alta dos preços. Dados recentes da Comissão de Negociação de Futuros de Commodities (CFTC), dos EUA, mostram que os fundos de hedge agora detêm um recorde de 73 biliões de dólares em ouro.
E O BITCOIN?
A espetacular recuperação do bitcoin foi impulsionada em grande parte pela reeleição de Trump. O apoio declarado dele às criptomoedas estimulou a procura e elevou a confiança nesse sector, que estava em queda.
No entanto, há evidências de que, assim como no caso do ouro, haja mais investidores institucionais a investirem em bitcoins. A commodity está a se tornar uma alternativa ao dólar e outros investimentos. Os esperados cortes nas taxas de juros também parecem estar a convencer os investidores a assumirem mais riscos com esse activo.
O bitcoin também parece estar a se fortalecer na esteira das incertezas sobre a economia dos EUA, com o shutdown do governo impulsionando a procura. “Desta vez, o shutdown importa”, escreveu o analista Geoffrey Kendrick, do Standard Chartered Bank, em nota aos investidores.
“Este ano, o bitcoin foi negociado com ‘riscos do governo dos EUA’, como demonstra a sua relação com o prémio de prazo do Tesouro dos EUA”, acrescentou, referindo-se à métrica que mede a compensação que os investidores exigem para manter títulos de longo prazo do governo e que reflecte o grau da sua confiança na estabilidade económica de longo prazo.
Outro factor que contribui para a força actual do bitcoin pode estar relacionado ao período do ano. Outubro tem sido historicamente um dos seus meses mais fortes para a moeda, com o preço tendo caído apenas duas vezes durante o mês de Outubro desde 2013.
QUAL É A TENDÊNCIA FUTURA?
Muitos analistas preveem que o ouro e o bitcoin continuarão a se valorizar, com a expectativa de novos recordes.
“Suspeito que o bitcoin subirá durante o shutdown e em breve atingirá 135 mil dólares”, prevê Kendrick. A probabilidade de o governo Trump continuar a favorecer as criptomoedas contribui para o optimismo.
Quanto ao ouro, poucos o veem a perder valor em breve. O banco britânico HSBC afirma esperar que os bancos centrais continuem a comprar ouro em grandes quantidades como uma protecção contínua contra riscos geopolíticos.
Isso está de acordo com o que o Conselho Mundial do Ouro afirmou no seu último comunicado trimestral, no fim de Julho, de que a sua pesquisa anual com bancos centrais mostrou que “95% dos gestores de reservas acreditam que as reservas globais de ouro dos bancos centrais aumentarão nos próximos 12 meses”.
Isso, juntamente com a crescente procura por ETFs por fundos de hedge e outros investidores institucionais, sugere que a commodity continuará a se valorizar.
Fonte: Folha de S. Paulo